Max Fun Zine - Inverno de 1990
Marcio Chuico entrevista Alexandre Cabral, vocalista dos Missionários
MFZ: Que fim levaram os punks, Alex?
Alex: Os punks de 5 anos atrás, aquele pessoal do Volta? Tá tudo a mesma coisa. Só não há mais festa punk, e não houve mais música punk. Mas tá tudo a mesma merda.
MFZ: Fale desse "boom" rockabilly em Curitiba. Tem umas 5 bandas tocando rockabilly em Curitiba agora. Acho que os Missionários foram os pioneiros, não?
Alex: Acho que sim, não tenho certeza. Acho que não tem nenhum "boom". Geralmente esses "booms" acompanham os de São Paulo, e lá foi há uns 4 anos atrás. Foi na época que abriu o Espaço Retrô, que era um lugar rockabilly e publicavam o Rabo de Peixe, que era um fanzine rockabilly legal. Agora não sei como começou aqui, mas é legal que aconteça porque também não tem que seguir São Paulo coisa nenhuma.
MFZ: Como foi a "Shockabilly Party"?
Alex: Foi legal, foi engraçado. Tocaram os Missionários, Playmobillys, Escroques e Abaixo de Deus. Tava todo mundo meio bebaço. Foi uma festa para dançar.
MFZ: E a Curitiba Rock Festival?
Alex: Foi um lance furado! Pagamos pra tocar, tocamos por último, só 3 músicas e quase todo mundo já tinha ido embora.
MFZ: Como pintou a idéia de fazer aquela cover da Gretchen no show da 1ª Mostra Internacional de Fanzines?
Alex: A minha idéia é de fazer versões rockabilly de umas músicas esquisitas, tipo Gretchen, Jerry Adriani, Antônio Carlos e Jocafi. Passei uma manhã dessas ouvindo compactos antigos na Raridade Discos. Mas o strip tease do Black e do Rodrigão (Beijo AA Força) nesse show foi ótimo. E no outro show, na Shockabilly Party, foi ótimo o strip tease do pessoal do Abaixo de Deus. Tinha um segurança lá que queria tirar eles do palco. Aí eu falei pra ele que fazia parte do show e o segurança foi lá e tirou a roupa também. (risos)
MFZ: E você continua fazendo fanzines?
Alex: Eu fiz este último, o Modern Living, porque tinha muito material guardado. Mas foi só. O Gopo eu faço até hoje, mas num ritmo ocasional, mesmo.
MFZ: Explique essa história de "bailarino profissional arrependido".
Alex: Pois é... Eu fui bailarino profissional mesmo.
MFZ: E por que arrependido?
Alex: Porque é uma merda de uma profissão. Eu cheguei a ser solista do Balé Teatro Guaíra. Eu era competente, mas encheu o saco, mesmo. Eu entrei iludido com aquele papo de "arte" e quebrei a cara!
MFZ: Você é de Belo Horizonte?
Alex: Pois é, sou. Nasci em Santos, mas me mudei pra lá aos 3 meses e fiquei até os 20 anos. E aí vim pra Curitiba.
MFZ: Fazendo uma comparação entre Curitiba e BH, lá eles tem uma organização boa, como Último Número, Sexo Explícito, Sepultura, etc. Em comparação com CWB, é um lance bem avançado ou no teu tempo não era assim?
Alex: Não. Não era, não. Agora, na questão de espaço, é a mesma coisa que aqui. Não tem lugar pra tocar e raramente tem show.
MFZ: E por que as bandas de lá aparecem mais que as daqui?
Alex: É que Curitiba já tem o estigma de ser uma coisa tacanha, culturalmente falando, um cemitério.
MFZ: Quais os projetos dos Missionários?
Alex: A gente não tem projeto. Somos extremamente desorganizados. O Gustavo quer viver de música, ele talvez tenha sonhos com os Missionários. Eu invisto na banda, mas sem ilusões de que vou virar cantor de rock.
MFZ: Mas vocês pensam em chegar no vinil?
Alex: Com certeza! Que banda que não pensa em chegar no vinil?
MFZ: Mas o que vocês estão fazendo para isso?
Alex: Por enquanto, nada.
MFZ: E shows?
Alex: Tô agitando o Espaço Retrô, em SP. Vamos tocar para os gays moderninhos do Retrô. (risos)
MFZ: Além dos Cramps, quais as outras influências da banda?
Alex: O Maurício é "ramonesmaníaco", o Gustavão é rockabilly. Tem uns 80 discos de rockabilly, compra o mesmo disco só porque saiu com uma capa diferente. Eu sou mais punk rock, mas escuto de tudo.
MFZ: A melhor letra da fita "The Rest of Missionários" é a "Música de Brinquedo". Quem escreveu?
Alex: Marcos Prado, Thadeu e Sérgio Viralobos.
MFZ: Como você vê o trabalho da Juke Box?
Alex: Eu acho jóia! A Juke Box é a loja que faltava em Curitiba. As outras lojas que mexiam com underground sumiram, nunca foram a fundo na coisa. O Carlos já vende fanzine de todo mundo, faz camisetas, etc.
MFZ: E este último disco do De Falla, você gostou?
Alex: Não, achei ridículo. Gosto dos 2 primeiros discos, mas neste último os caras retrocederam no lance de estilo. Tão fazendo um estilo que é mais que furado. E heavy sempre foi um troço ruim, um troço chato.
MFZ: O que você tem ouvido de bom?
Alex: Eu ouço muito jazz, agora. Neste exato momento estamos ouvindo James Brown. Vamos ver o que eu ouvi hoje... Devo, Clash, Pixies, Cramps, Batmobile, Iggy Pop, David Bowie, Guanabatz.
MFZ: E o que você anda vendo de bom? Você vai muito ao cinema?
Alex: Vou, sim. O último filme que eu vi foi "Navigator". Achei jóia, bom mesmo! E o filme que mais me surpreendeu nos últimos tempos foi "Afogando em Números" do Peter Greenaway, que é do cacete! O meu pai me ligou agora só pra me dizer para não perder outro filme dele, "O Cozinheiro, o Ladrão, sua Mulher e o Amante", um monte de gente.
MFZ: E dos filmes antigos?
Alex: Eu gosto do "Terceiro Tiro" do Hitchcock, do "Festim Diabólico", "Cantando na Chuva", "Manhattan" do Woody Allen, "Play it Again, Sam" também do Woody...
MFZ: Continuando as perguntinhas no estilo da Folha de São Paulo, o que você está lendo?
Alex: A "História do Medo no Ocidente", é uma análise do comportamento do Homem sob a ótica do medo, como o Homem chegou a se comportar como se comporta hoje, pelos medos que ele sentia desde a Idade Média até meados do século XVIII: peste, sífilis, o mar, a inquisição.
MFZ: O que você tem visto de bom em matéria de fanzines?
Alex: Ultimamente eu só vi um fanzine bom, o Tattoo, de SP.
MFZ: E aquela história que você já leu "Watchmen" 17 vezes?
Alex: Isso é papo furado. Eu já li 21 vezes! (risos) Pra mim, é o melhor quadrinho que já foi feito.
MFZ: E o que mais você gosta em HQ?
Alex: Do Alan Moore eu gosto tudo. Acho "V de Vingança" do cacete, apesar de ser triste.
MFZ: Você acha que os quadrinhos tem algum compromisso com o humor sempre? Na grande maioria das vezes pode-se fazer HQ muito bem sem humor, não?
Alex: É, eu não acho "Watchmen" engraçado, não. Mas "V de Vingança" é muito melancólico.
MFZ: Quais são seus autores favoritos?
Alex: Ultimamente é o Alan Moore mesmo. Lugar comum, mas é verdade.
MFZ: E os nacionais? Angeli, Glauco ou Laerte?
Alex: Laerte é o mais criativo e o que desenha melhor. Eu gosto do Glauco pela cara de pau dele de fazer humor com o traço mais básico e ficar engraçado, tipo: o cara que vai e vomita no colo da mãe, coisa que "a priori" seria uma coisa baixa, a coisa mais óbvia e sem graça do mundo, mas fica engraçado do jeito que ele faz. Já o Angeli eu gosto, mas não sou fã.
MFZ: Fale sobre seu outro grupo, o Die Bundes Republik.
Alex: Bom, é um grupo que eu e o Rodrigão (BAAF) inventamos. Bem, em vez de assumir um rótulo para a banda, ou negar, a gente assumiu todos os rótulos. A idéia era fazer uma banda que fosse meio acid, dance music, mas que fosse barulhenta, não fosse essa nhaca que é a dance music!
MFZ: Você não gosta nada de dance music?
Alex: Gosto de Nitzer Ebb, de Neon Judgement, Front 242. E essas bandas trabalham com tecnologia, e como a gente não ia ter dinheiro pra usar tecnologia, o primeiro rótulo que a gente assumiu foi o low-tech. Aí, o outro lance que a gente inventou foi o "do it yourself service", que pode ter várias interpretações. Pode ser traduzido como "sirva a você mesmo", que é parecido com o "faça você mesmo" do punk, ou pode ser um serviço de "do it yourself": você não precisa mais fazer você mesmo. Você liga e a gente faz pra você. (risos) A idéia era trabalhar com o maior número de colagens possível. A banda tinha 3 baterias: uma eletrônica, uma gravada e uma ao vivo. Aí a gente fez uma fita base que era a bateria gravada junto com vários sons. Tinha S.O.D., William Burroughs falando, umas gurias cantando ópera, tudo misturado. E em cima dessa fita a gente fez 3 músicas. A idéia era fazer shows de tamanho padrão, entre 10 e 12 minutos. É tudo muito barulhento, quem viu o ensaio achou engraçado. Outros torceram o nariz. Parece som aleatório mas não é, porque sempre que a gente tocava saía igual, porque é ritmico. Outro rótulo nosso é música brutalista.
MFZ: Vocês nunca chegaram a tocar ao vivo, mas estão pensando nisto?
Alex: Não sei. A gente nunca mais falou sobre isso.
MFZ: Quem são os bunders?
Alex: Os bunders são 4: eu, o Rodrigão, o Maurício e o Trindade. A gente tinha também letras em alemão. Uma letra engraçada era de um alemão perguntando quais as praias mais badaladas do sul, meio non sense, e o refrão era "Onde mora Amir Klink?". Outra letra era "Numb Dance, Dumb Music", era só isso a letra da música. Outra era uma versão noise da Marselhesa. Mas é um negócio que nunca daria certo em Curitiba. Era muita zona.
MFZ: O Rodrigo disse uma vez que o objetivo principal de ter uma banda era comer mais menininhas, e só depois é tocar. Com os Missionários é a mesma coisa? Ou você prefere a monogamia?
Alex: Aquele papo de monogamia é papo furado! Você leu na Animal isso, né? A gente tem tiétes fiéis! Não é uma desconhecida bacaninha que a gente viu que vem dar em cima. São sempre aquelas mesmas que vão ao show e a gente já viu bastante.
MFZ: Você também faz histórias em quadrinhos?
Alex: Eu já pensei em fazer quadrinhos, mas tudo na base da colagem. Quem fazia isso era o Liberatore, do Ranxerox. O traço dele não era tão realista como hoje. Era mais caricato e onde, por exemplo, precisasse de um prédio, ele não desenhava, e sim colava uma fotografia. E ia mais além, colava quadrinhos alheios no meio da história.
MFZ: E você já fez aquela tua colagem com as Paquitas?
Alex: Não fiz ainda. Eu tenho que achar uma foto legal delas.
MFZ: E qual é a idéia?
Alex: Eu quero declarar a minha pedofilia nazista pelas paquitas! É que elas são escolhidas pela ótica ariana! (risos)
MFZ: E que fim levaram os teclados dos Missionários?
Alex: Acabou. Porque o Mário era muito chato pra ensaiar. Era pentelho, bebe pra caralho e fica enchendo o saco.
MFZ: Mas ele já tocou com vocês?
Alex: Já, agora não toca mais. Agora nós vamos tocar na Metrô* e... Quero dizer, no Retrô. (risos) Pois é, vamos tocar no Retrô, com as menininhas de lá fazendo strip tease. (risos)
MFZ: Foi um ato falho interessante, porque é a idéia é ótima. (risos) Porque vocês não aprontam uma dessas?
Alex: Ah, o Metrô tem um público certo.
MFZ: Ora, levem o público dos Missionários para o Metrô. Ou Vice versa! (risos)
Alex: É o público do Metrô que não ia gostar da gente nunca. (risos e risos) Mas eu ia achar do caralho! (risos)
* Nota: Metrô (ainda) é uma boate de quinta categoria em Curitiba.
People Ain't No Good - The Cramps
caramba primo!
ResponderExcluirde onde vc desenterrou isso? digitou tudo ? que paciência.
"chegar no vinil" rerererere
caralho! como estamos velhos, meu topete já tem mais cabelos brancos do que castanhos. essa entrevista foi feita em 89, eu acho, e o zine saiu em 90.
Me sentia velho, agora então...
ResponderExcluirNavigator? Nem lembrava mais disso.
Verdadeira cápsula do tempo.
Achei que era algo que valia a pena ser resgatado. Hehehehe! Qualquer hora dessas eu transcrevo a entrevista que a gente fez com o Angeli, Laerte e Glauco... Tem com o Luiz Gê, também. Sujeito super humilde!
ResponderExcluirtenho que achar o audio disso tudo, deve estar numa velha K7, numa caixa aí em curitiba...
ResponderExcluirPô! Vamos digitalizar isso e disponibilizar aqui! :)
ResponderExcluirNem eu lembrava mais do Max Fun Zine! Tem que resgatar isso, mesmo. A tempo, Lux Interior manda dizer que a música é "People Ain't No Good" e não "Peope...". Sabe como é, né? Ele é chato...
ResponderExcluirPô... Depois de transcrever tudo isso você ainda esperava que eu escrevesse "people" corretamente?
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